Situação de aprendizagem - texto "Pausa", Moacyr Scliar

 A situação de aprendizagem a seguir, foi planejada com base nos textos "Gêneros e progressão em  expressão oral e escrita  -  elementos para reflexões sobre uma experiência suíça (francófona)", de Joaquim Dolz e Bernard Schneuwly e "Letramento e capacidades de leitura para a cidadania", de Roxane Rojo, com o objetivo de desenvolver as capacidades leitora e ecritora nos aprendizes do Ensino Fundamental II.

Texto "Pausa", de Moacyr Scliar

     "Às sete horas o despertador tocou. Samuel saltou da cama, correu para o banheiro, fez a barba e lavou-se. Vestiuse rapidamente e sem ruído. Estava na cozinha, preparando sanduíches, quando a mulher apareceu, bocejando:

     —Vais sair de novo, Samuel?

     Fez que sim com a cabeça. Embora jovem, tinha a fronte calva; mas as sobrancelhas eram espessas, a barba, embora recémfeita,  deixava ainda no rosto uma sombra azulada. O conjunto era uma máscara escura.

     — Todos os domingos tu sais cedo — observou a mulher com azedume na voz.

     — Temos muito trabalho no escritório — disse o marido, secamente.

     Ela olhou os sanduíches:

     — Por que não vens almoçar?

     — Já te disse: muito trabalho. Não há tempo. Levo um lanche.

     A mulher coçava a axila esquerda. Antes que voltasse à carga, Samuel pegou o chapéu:

     — Volto de noite.

     As ruas ainda estavam úmidas de cerração. Samuel tirou o carro da garagem. Guiava vagarosamente, ao longo do cais, olhando os guindastes, as barcaças atracadas.

     Estacionou o carro numa travessa quieta. Com o pacote de sanduíches debaixo do braço, caminhou apressadamente duas quadras.

     Detevese  ao chegar a um hotel pequeno e sujo. Olhou para os lados e entrou furtivamente. Bateu com as chaves do carro no balcão, acordando um homenzinho que dormia sentado numa poltrona rasgada. Era o gerente. Esfregando os olhos,  pôsse de pé.                               

     — Ah! Seu Isidoro! Chegou mais cedo hoje. Friozinho bom este, não é? A gente...

     — Estou com pressa, seu Raul!—atalhou Samuel.

     — Está bem, não vou atrapalhar. O de sempre. — Estendeu a chave.                                                                           

     Samuel subiu quatro lanços de uma escada vacilante.

     Ao chegar ao último andar, duas mulheres gordas, de chambre floreado, olharamno com curiosidade:

     — Aqui, meu bem!—uma gritou, e riu: um cacarejo curto.

     Ofegante, Samuel entrou no quarto e fechou a porta à chave.

     Era um aposento pequeno: uma cama de casal, um guardaroupa de pinho; a um canto, uma bacia cheia d'água, sobre um tripé. Samuel correu as cortinas esfarrapadas, tirou do bolso um despertador de viagem, de corda e colocouo na mesinha de cabeceira. Puxou a colcha e examinou os lençóis com o cenho franzido; comum suspiro, tirou o casaco e os sapatos, afrouxou a gravata. Sentado na cama, comeu vorazmente quatro sanduíches. Limpou os dedos no papel de embrulho, deitouse e fechou os olhos.

     Dormir. Em pouco, dormia. Lá embaixo, a cidade começava a moverse: os automóveis buzinando, os jornaleiros gritando, os sons longínquos.

     Um raio de sol filtrouse pela cortina, estampou um círculo luminoso no chão carcomido.

     Samuel dormia; sonhava. Nu, corria por uma planície imensa, perseguido por índio montado a cavalo. No quarto abafado ressoava o galope. No planalto da testa, nas colinas do ventre, no vale entre as pernas, corriam.

     Samuel mexiase e resmungava. Às duas e meia da tarde sentiu uma dor lancinante nas costas. Sentouse na cama, os olhos esbugalhados: o índio acabava de trespassálo com a lança. Esvaindo-se em sangue, molhado de suor, Samuel tombou lentamente; ouviu o apito soturno de um vapor. Depois, silêncio.

      Às sete horas o despertador tocou. Samuel saltou da cama, correu para a bacia, lavouse. Vestiuse rapidamente e saiu. Sentado numa poltrona, o gerente lia uma revista.

     — Já vai, seu Isidoro?

     — Já — disse Samuel, entregando a chave. Pagou, conferiu o troco em silêncio.                                                                                   

     — Até domingo que vem, seu Isidoro—disse o gerente.

     — Não sei se virei—respondeu Samuel, olhando pela porta; a noite caía.

     — O senhor diz isto, mas volta sempre — observou o homem, rindo. Samuel saiu.

     Ao longo do cais, guiava lentamente. Parou, um instante, ficou olhando os guindastes recortados contra o céu avermelhado. Depois, seguiu .Para casa."

SCLIAR, Moacyr. In: BOSI, Alfredo. O conto brasileiro contemporâneo. São Paulo: Cutrix,1997

polianabrito.blogspot.com

 

Situações de aprendizagem do texto: “Pausa”, de Moacyr Scliar:

 

Público-alvo: 7º ano do Ensino Fundamental

Atividades para serem desenvolvidas em seis aulas

1º) Ativação de conhecimento de mundo

Roda de conversa: Antes da leitura do texto, oralmente, fazer perguntas sobre o título do texto e levantar hipóteses sobre o que o texto pode informar:

▪ O que pode acontecer em uma história que tem um título como esse?

▪ O que é pausar para você?

2º) Localização de informações                                                   

Após a leitura do texto, acompanhada pelo professor e o esclarecimento do vocabulário desconhecido pelos alunos,  pedir aos mesmos que localizem no texto e explanem oralmente:

▪ Título, autor e local onde foi publicada a história;

▪ informações que comprovam a rotina do personagem;

▪ o tema e o subtema apresentados no texto.

3º) Produção de inferências globais e locais

Fazer perguntas aos alunos para que respondam no seu caderno:

Inferências Locais: Onde ia Samuel todos os domingos após sair de casa? Destaque no texto situações que o fizeram mudar a sua rotina.

Inferências Globais: Por que vocês acreditam que Samuel criou essa rotina? Por que ele não fica com a mulher aos domingos?

                Analisando o trecho “... nu, corria por uma planície imensa ...”, o que esse sonho representa na história do personagem? O que ele quis dizer com a lança do índio?

 4º) Recuperação do conteúdo de produção                                                                                                                        

Pesquisa:

▪ Vocês conhecem o autor do texto?

▪ Quem provavelmente pode ser o público-alvo desse texto?

▪ Onde esse texto pode ter sido publicado?

▪ Em que situação ele escreve esse texto?

5º) Percepção das relações de intertextualidade

Apresentação do filme “Click” focando a pausa como um meio de escape da realidade e as consequências que essa fuga pode trazer.

6º) Percepção de outras linguagens

Produção de uma história onde Samuel explica os motivos pelos quais ele faz essa “pausa” em sua rotina aos domingos.

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